Enfeitado , disfarçando; traduzindo: as horas, o tempo que passa, inexorávelmente, e sentindo os sentidos da minha vida e de tudo e todos os que minha alma toca e abrange. Bem vindos a este meu Universo.
Enfeitado , disfarçando; traduzindo: as horas, o tempo que passa, inexorávelmente, e sentindo os sentidos da minha vida e de tudo e todos os que minha alma toca e abrange. Bem vindos a este meu Universo.
Talvez se seja mais feliz sendo louco. Talvez valha mais a certeza do incerto do que a incerteza do que é certo. As minhas memórias da loucura estão escondidas através do dia-a-dia. Talvez tenha que mudar de método, talvez tenha que mudar o meu discurso, talvez tenha que mudar o meu pensamento. Talvez eu consiga ser outro sendo quem sou. Tenho que me agradar a mim próprio para andar bem. Talvez eu deva desistir de pensar que tenho de fazer qualquer coisa. Talvez eu tenha que dar o braço a torcer. Talvez este mundo não me pertença. Tenho que sair das sombras, estou farto desta escuridão. Tenho um longo caminho a percorrer até ao sítio onde eu me vou encontrar bem, não posso parar. Eles vão ganhar, vão levar a deles avante. Terei que me vencer a mim próprio. EU SOU NORMAL. Não ando pelas regras dos outros, eu próprio criei as minhas regras. Eu quero ser independente. Eu parei no tempo em muitos aspetos. Eu sou finito. Todo o homem é finito. Eu não poderei mudar o mundo. Mas porque a imagem pode? Porque pode a palavra? Porque o muda o som? Porque o muda a técnica? Porque eu não possuo um desses meios de mudar o mundo? É só sentir, só absorver, é só esconder, como um bicho do mato. Como se o mundo parasse de rodar quando eu desfalecesse, como se eu fosse ponto fulcral, se é que o já não fui. Tudo o que fui a apagar-se, o tempo a passar, e eu perco a partida. Como dar a volta, eis a questão? A minha imagem não é a imagem de aparência. Ela é o retrato de quem eu gostava de ser. A minha imagem traduzia-se pela perfeição. Mas como eu posso ser perfeito se eu sou simplesmente um humano? "Heaven is a place on earth". Talvez isso seja verdade, talvez o paraíso seja um lugar na terra. Não, não sou feliz, não sou bem-humorado, sou sério, a minha imagem não é o `faz ver'. Será que o homem só pode estar ao pé do outro estando bem-disposto, com uma boa imagem? Porque teima o homem em andar no mundo da ilusão? Já não é o suor que une os homens, mas sim a boa aparência, a falsidade das palavras. E a cada momento que passa ponho em hipótese se as minhas palavras transmitem algo com sentido. Até parece que o Outono deixou de ser Outono. Até parece que o Inverno se transformou em Verão e vice-versa. Mas isso já não me preocupa. Talvez o que mais me preocupa neste momento seja a minha sobrevivência. As flores desabrocham, o sol nasce, a lua aclara a noite. A noite mantinha o ritmo, a noite quebrou o ritmo. O mundo tem perspetivas e perspetivas, as variáveis são imensas, as palavras já serão poucas para descrever tudo. O mundo nunca será mais o mesmo. A vida nunca mais será a mesma. Eu preciso de sobreviver, mas já não sei como me aproximar dos homens, porque será que assim acontece? O meu mundo desabou e não tem mais sentido como era. Mas novos mundos podem surgir. Talvez eu já tenha perdido tudo o que tinha a perder.
Eu vivi na escuridão, literalmente: Os meus primeiros dois quartos eram escuros, não tinham janelas para o exterior – nunca contei isto acerca da minha vida. Cresci, bastantes anos, demasiados e importantes anos, sem saber quando amanhecia, sem a alegria de ver os dias que chegavam, a chamar-me. Acordar era como entrar num pesadelo, mais ainda, quando, ainda para mais, em vez de encarar com a luz a entrar pelo meu quarto entrava um vulto com uma voz estridente e sem sensibilidade para me chamar, pelo menos normalmente, já que não fosse com calma ou com ânimo, de que tinha que enfrentar, ou melhor ‘Fazer isto aquilo ou aqueloutro’ em mais um dia. Na verdade eu deveria era ‘abraçar’ [esse devia ser o direito da minha pessoa enquanto criança] e não ‘enfrentar’ mais um dia, estando eu na idade em que estava. Dou comigo por vezes a lembrar-me, vivamente, desses sentimentos que me assolavam e a compreender o que sinto e sou hoje, desses sentimentos que fazem parte de mim, em grande parte, ainda hoje. Assim, ainda continuo com as mesmas questões da altura: porque tende o mundo a fugir de mim, a calma, o que há de belo e a liberdade? E porque tende a depressão, a tristeza, a melancolia, a fraqueza de espirito a perseguir-me? Porque me persegue a escuridão? A minha contrariedade é grande, e é grande a quantidade dos meus desejos frustrados. Dei por mim, neste ultimo ano, a descobrir mais mundo através da internet, a descobrir muita da luz que me envolve, a natureza do resto do mundo que não conhecia, um grande resto do mundo natural que eu defendia sem nunca o ter visto, e tenho visto muito do social. Com isto tudo busco a luz do bem-estar da minha vida, mas, sinto que tudo me foge muito mais rapidamente também. Trabalhei aproximadamente 10 anos de noite. Até essa altura, que comecei a trabalhar de noite, a minha situação era má, para não dizer de ‘prognóstico’ péssimo: Eu não tinha grandes expectativas nem sabia por onde sair da situação em que estava; com muito pouco dinheiro e sem saber o que fazer para conseguir ganhar a vida, dada a situação de saúde mental em que me encontrava; foram anos difíceis, pelo menos os primeiros 3 anos que se seguiram. E assim, mais uma vez, quando comecei a trabalhar de noite, a escuridão me envolveu, mais uma vez eu senti que estava só no mundo e que estava como um barco à deriva em alto mar, e me fez querer que sou um ser solitário; desta vez eu poderia apreciar o nascer do dia que tanto tinha perdido na minha vida, mas, na verdade, eu não o apreciaria porque o dever de cumprir o meu trabalho não me deixava lugar para ter as minhas sensações, eu tinha que ganhar dinheiro, eu tinha de aguentar todos os nervos que me consumiam, eu tinha que aguentar [pensei que explodiria de tão louco estar, além da loucura que já tinha], não podia pensar em bem-estar, de ver os amanheceres calmamente, que estavam defronte a meus olhos; ‘Que será de mim? Aguentar-me-ei muito mais tempo aqui? Que farei se não me aguentar aqui (?), irei caminhar erroneamente para sempre, decerto…(?)’. Até que nos últimos anos (talvez os últimos 4) eu os pude apreciar, os diferentes amanheceres que se mostravam em toda a sua beleza, já com mais calma, algo em mim mudou, idealmente e fisiologicamente. Pensando agora nessas noites, em que tudo toma um movimento diferente, e provoca uma maneira de sentir diferente nas pessoas (julgo assim pela maneira como eu senti), uma acalmia, uma alucinação, que me levou a aprender o que nunca julguei aprender na vida. Durante esse tempo eu li, li muito; Eu pensei e reflecti, muito; eu me compreendi, e muito. E, ainda assim, apesar da compreensão, da acalmia etc, não aprendi a ganhar dinheiro na vida activamente, a virar meus pensamentos para a economia e subsistência; A minha subsistência não está periclitante a curto prazo, mas a um médio - longo prazo ela poderá estar seriamente em causa. Estou a envelhecer, tenho medo de perder ou de não conseguir aguentar o espirito de juventude que gostava de continuar a ter, os hábitos de ouvir música, ver um filme, mas ao mesmo tempo tenho que fazer algo para que não entre em miséria um dia, não posso perder tempo só a olhar para o computador, a curtir a música e as belas imagens, tenho que ser produtivo e ganhar com isso. E eu não estou bom, estou melhor, apenas, e tudo isto que digo é relativo.
As minhas dificuldades sociais sucedem-se. O tempo passa e eu fico a perder no que diz respeito à sociabilização, mesmo este tempo de escrita me parece perdido por vezes como se fosse um monólogo fútil. Desabafo aqui e não me adianta, mas pelo menos ‘lanço as sementes ao vento’. Nestes dez anos de trabalho nocturno eu senti uma força estranha que me fez evoluir e compreender a um ritmo que julgo estar a perder ao longo deste último meio ano. As sensações que tive nestes dez anos de vivacidade sentimental foram as mais díspares, diversas e com intensidades variadas, com os horários de sono diurnos, quando trabalhava, e quando de folga, tudo se mesclava entre o cansaço, a troca de sono e de regime e horário alimentar; os sentidos tomavam e captavam novas sensações as quais eu tentava compreender; a música acompanhou-me neste tempo todo: houve a redescoberta das músicas que me marcaram enquanto jovem e a entrada no ‘mundo’ dos novos sons que a rádio me ‘servia’ no dia- a -dia, coisa que tende a desaparecer [terei eu começado já a decadência?]. A minha memória funciona de uma maneira que não se adequa a ambientes sociais complexos, e até minimamente complexos. A maneira como o meu cérebro interpreta as coisas até pode ser válido [em certas situações], e a mim parece-me que é, mas não é adequado às interacções sociais que diria que são normais, e adequado à sobrevivência económica. Eu provoco o meu afastamento dos outros; num mundo de expressão como é o nosso eu sou inexpressivo e mal-entendido quando tento me exprimir, eu sou diferente e não aceite, não compreendido. Eu não domino o que me envolve de modo a eu me adaptar ao que me envolve e o que me envolve se adaptar a mim. Eu vivo na incoerência do agir, ao contrário da norma, eu fujo dela e a vejo do lado de fora, eu os vejo interagir e com surpresa não me identifico com eles, e, eles me marginalizam, porque não querem compreender a escuridão.
Estado de alerta. Estado de aparente clarividência. Estado de auto-controlo máximo. Estes parecem ser alguns dos meus principais estados que fazem a minha vida. Pânico de perda de controlo. Pensamento constante sobre a vida e a sua efemeridade, a morte como algo certo que nos persegue. Pergunto-me o sentido da minha existência, o para quê da acumulação de saber, como se houvesse continuação das coisas quando tudo parece apontar para um fim de uma existência sem um motivo, apenas uma casualidade. Para onde irá toda esta grandiosidade de sentimentos depois de um fim, que parece perseguir todos os seres, e que lhes encurta o caminho aos mais incautos, desprevenidos ou com pouca sorte. Serei sortudo ou azarado nesta contabilidade de sortes e azares que constituem a vida, a minha vida? Vivi um estado de tensão constante - Gostaria de dizer para sempre deste modo, como se tudo isso fosse passado -. Vivi desfasado da vida comum sem o perceber, sem perceber de tudo o que afluía a mim (de uma maneira muito estranha). Ainda sou um desfasado. Vivo à margem, mas não quero dizer marginalizado. Continuo a achar estranho tudo isto que se passou, mas encontro nexo na compreensão das coisas que se passaram, tenho teorias que encaixam, finalmente, como se começasse a perceber as leis que regem a minha vida. Talvez as leis que regem a vida psíquica das pessoas não seja igual em ninguém, e talvez isso nos torne únicos. Mas temo que a minha vida me esteja a escapar, inevitavelmente, nunca tomando um rumo com que sempre sonhei. E, uma coisa é certa, estou dentro de um sonho, mesmo que não seja propriamente aquele que eu queria ter, até porque nunca estamos satisfeitos com o que temos e onde estamos, mas, no fundo, eu estou. Só que as pessoas desestabilizam-se umas às outras, propositadamente ou despropositadamente. Eu sinto o vibrar de todos os seres em mim. Sinto um estado dentro de mim, para além do visível. E com isto caminho nesta vida, a minha vida, feita de leis próprias que se tornam gigantes quando tento fugir delas. Pergunto-me, constantemente: porquê? Porquê a vida tem que mudar de estado? Porque não podemos captar o estado perfeito na nossa vida (?) e apreendê-lo para sempre em nós, o estado da eterna juventude e do momento e sentimentos perfeitos, e vivermos assim até ao momento das nossas mortes (?). Porque se agita esta amálgama de seres neste mundo (?) e se empurram uns aos outros, porque monologam os homens (?) na busca de uma lei eterna, de um eterno saber? I’m just asking why? Eu pergunto o porquê? Porquê este Enigma que consome quem o enfrenta (?) – mas o consome de prazer, como se fosse um masoquista -. Apaixonamo-nos na vida, pelos seres, pelo desconhecido, pelo novo, pelo que subsiste ou pelo que é vulnerável, pelo pequeno e pelo grande, como se existisse, ainda, uma criança em nós, em mim, constantemente, curiosa e maravilhada por tudo quanto existe, uma alma aberta a um Universo que estranhamente se torna conhecido a cada passo que se dá, e que se revela incomensuravelmente maior quanto mais o descobrimos e sabemos dele. Esta é a lei que me rege desde os meus primórdios, a lei de uma igreja e da existência de algo maior que a própria sabedoria de todos os seres da terra que existiram e irão existir, algo que engloba tudo e que nunca conseguiremos transpor fisicamente, mas, que acredito que seja tangível, açambarcável e compreensível psiquicamente - ou então eu vivo numa ilusão constante -. Amo a natureza, os seres, como se não me cansasse de o dizer, como se os seres e tudo quanto existe fosse bom por natureza. Gosto do campo e do trabalho nele, a liberdade da existência e o cultivo do fruto necessário para essa existência. Não desvalorizo quem tem as mãos calejadas pela dureza saudável da vida e rejeito os seres, homens sobre todos os seres que menosprezam aquilo que é essencial, como se a cultura fosse o móbil do homem, a cultura do ignóbil em detrimento da sabedoria da existência. Mas quem sou eu para dirigir os caminhos desta terra, quem será alguém, que existe, para fazer tal? Contudo, ninguém, nenhum ser, pode fugir à responsabilidade dos seus passos e dos seus actos. E com isto constato que a linguagem muda através dos tempos, mas a ideia do que é transmitido perdura através da existência, a existência da terra e do Universo que produz todos os ideais, e assim, também podemos encontrar a mensagem da existência de cada ser em particular através das eras.
Na minha vida sou, ainda (pelo menos um pouco) movido por uma ideia que afinal se prova ser errada, eu estava enganado, completamente: <<não quero influenciar nem ser influenciado, muito menos negativamente>>. Não sei porque tive tanto tempo esta ideia de querer ser um agente neutro neste mundo, ou um agente positivo. De onde surgiu esta ideia? Não sei, ainda… Mas surgiu-me, claramente, na minha mente como uma espécie de clarividência que todos temos que influenciar e ser influenciados, a neutralidade não existe. A nossa presença neste Universo é um sem fim de influências, como uma osmose, influências directas e indirectas. Mesmo que pareça que não estamos a influenciar nada, podemos estar a influenciar muito mais do que pensamos, todo o Universo que gira à nossa volta. E não quer dizer que a nossa influência tenha que ser negativa ou positiva muitas vezes, mas não deixa de ser uma influência que faz mudar o que gira em torno do nosso ser e que nos dá um feedback, que nos quer fazer mudar também, em ultima instância (num estado ultimo), aniquilar. Desde o que pensamos até ao que fazemos, a nossa acção, influencia o nosso futuro, e nós não temos consciência disso na maioria das vezes, e, mesmo que tenhamos, muitas vezes não somos capazes de controlar o sentido do nosso caminhar. Realmente eu vivia oprimido e ainda sofro as consequências disso: o medo de influenciar e ser influenciado, o medo de provocar coisas negativas que se voltassem contra mim e me aniquilassem, ou pior, me magoassem. E, contudo, eu saí magoado. Agora vejo mais claramente como o mundo de influências funciona, vejo que todo o homem erra, e errou. Vejo homens a levar povos no caminho negativo, a provocarem guerras, sofrimento, em nome de culturas e de progresso, em nome de uma paz inalcançável, a prometerem um mundo melhor, mas prosseguindo a destruição sem a conseguir deter. Vejo homens, que lutam pelo instinto mais básico de um ser desde que a vida existiu, a sobrevivência e a perpetuação daquilo que é esse ser, seja a que nível de conhecimento for. Vejo e não posso fazer nada, apenas suspirar de tanta opressão do meu ser, de tanta injustiça, que nunca se vai remediar. Temo que todas as opressões me tenham já encurtado a vida. E, então, serei eu, ainda agora, tal como esses homens de renome, mais um a lutar pela sobrevivência, talvez, este, o primordial estado da vida.
É urgente o desejo intenso que nos consome. So, come to me… É urgente e incompreensível, a necessidade de satisfazermos os nossos ímpetos. Tendemos para o outro e a vida não faz sentido sem o outro. Vivemos também porque fazemos parte de uma sociedade, complexa, e de tal maneira complexa, que nos torna vulneráveis, pelo afastamento que já temos, e cada vez mais temos, da sociedade de outrora. Cada vez somos menos auto-suficientes e mais dependentes desta sociedade, e se algum dia acontecer algo de grave na estruturação da nossa sociedade e da maneira como esta se organiza, vai haver muito provavelmente uma grave crise social. Vejamos um exemplo localizado, o furacão Katrina de 2005 que assolou a América, mais precisamente em Nova Orleães. O furacão pôs à mostra e demonstrou precisamente a incapacidade humana para dar uma resposta conveniente face à situação que se gerou. Não morreram mais pessoas porque fugiram a tempo, mas quem ficou, sentiu na pele a impotência de não poder fazer nada e nem as ajudas (externas) foram imediatamente frutíferas e salvadoras tal foi o caos que se criou com o rebentamento dos diques que orientavam as águas e que inundaram a cidade, sendo ela plana e estando numa situação de localização baixa, julgo que abaixo de tais canais que orientavam a água. Toda aquela cidade complexa ficou imensamente destruída (socialmente muito mais, talvez) e com uma reconstrução difícil pela frente. Os que sobreviveram necessitaram de ajuda exterior, concerteza, para o difícil futuro que se previa. Individualmente, cada ser em particular, de uma maneira geral, possui precisamente, hoje em dia, menos capacidade física para reagir com força física a possíveis problemas que possam surgir, caso surja a impossibilidade de ter todos os seus artefactos, toda a sua técnica - que é o que faz desenvolver toda esta sociedade, com base na exploração da natureza em profundidade como nunca foi feito antes – à mão e a poder funcionar para salvação em caso de catástrofe. O homem hoje em dia está mais vulnerável, de uma maneira geral, e psicologicamente também. Se de repente nos virmos sem electricidade, logo sem televisão e computadores e outras coisas mais que fazem parte do nosso dia-a-dia, o homem cairia num vazio, o de como agir perante tais ausências, que poderia ser mais momentâneo e reagir, ou então poderia prolongar-se e não ter a capacidade de reagir e cair numa depressão (dependendo das pessoas) – e isto seria um filme de terror. Eu não sei como reagiria a uma situação dessas, mas provavelmente mal, sei-o. Mas a vida é mais que um filme de terror muitas vezes, sentimento que eu não descarto, tal é a dureza com que age com certos homens (psicologicamente em mim, também). O homem tem uma noção de que as coisas se alteram muito gradualmente e tudo o que é geral se mantém no tempo, e que todas as técnicas novas criadas, e que tudo o que conquistou é um dado adquirido, que existe uma estabilidade. Mas eu diria que cada vez mais a catástrofe é iminente, sendo uma questão de tempo, mais ou menos curta ou mais ou menos longa, e que o homem tenta prever, e procura não acreditar, porque não consegue imaginar, ou não quer imaginar, o que será tal coisa, a catástrofe, ou por ignorância, ou por outro motivo qualquer. Uma catástrofe pode por em causa tudo. Para já todas as catástrofes estão a ser localizadas, apesar de cada vez mais frequentes. E estou a lembrar-me do terramoto do Haiti, em Janeiro deste ano. Aquela sociedade ficou literalmente arrasada. A sobrevivência fica seriamente comprometida com tais catástrofes, em que os seres ficam à mercê da sorte do que os rodeia, de acordo com as suas características físicas e mentais (psicológicas). Mais do que em qualquer situação, as catástrofes geram, ou devem gerar (se não for o caso de gerar), união entre os seres para que se possa reconstruir toda uma nova estabilidade e uma organização de vida social e material. Mas a perda mais ou menos massiva de vidas é inevitável. O espaço é cada vez mais reduzido, a exploração é intensa, e as pessoas só querem viver imensamente mais do que o necessário, e desnecessariamente abusam do material, da matéria-prima, consomem os recursos, e não pensam no futuro das gerações, porque todo o homem, se pudesse, viveria, egoisticamente, tudo numa só vida, não tendo capacidade de abdicar pelo seu futuro, pelo amor dos seus filhos e de todos os seus primogénitos, das pessoas que são os outros. Necessitamos do outro, e a nossa cultura para partilhar a nossa vida com o outro é complexa. E nesta complexa sociedade culturalmente evoluída, o individualismo está acima do todo que é a sociedade. Com o individualismo vem o orgulho, o menosprezo pelo que nos envolve como se cada um, cada ser que nasce, tem todos os direitos acima dos outros, mas mais ainda, acima da própria natureza. Pois esta civilização é um momento, no meu olhar, perspectivado do que sei.
A urgência do desejo cega-me, assim como cegará todo o homem, que age inconscientemente por um sentimento animalesco, e mais, por um sentimento de poder, de dominar o outro. Continuo a achar que o homem não passa de um simples animal, que tenta atingir o domínio do Deuses, mas errando completamente o seu percurso, porque à medida que chega perto do conhecimento dos Deuses, deixa atrás um caminho de destruição, porque será eternamente imperfeito. A destruição do seu espaço será a sua aniquilação. O homem segue errante. Resta a consolação na urgência do desejo, do amor, que nos leva ao sonho. Somos infinitamente pequenos, mas com visões altaneiras, é certo, e bastos como formigas que trabalham cegamente com uma finalidade não definida, que não sabem para que trabalham. – Sei que falo como se eu fosse de um mundo diferente, como se do que falo não me fosse afectar a mim, mas sou um homem, simplesmente, e a urgência do sentir faz-me utilizar todos os recursos que tenho para comunicar com o que é exterior a mim, com o Universo, com a natureza que me envolve, e sou afectado por tudo o que sinto e digo -. Que significa ‘sobrevivência’? Perpetuação dos genes e viver o tempo suficiente para tal acontecer. 'Procura do amor' dirá o homem hodierno. E os significados diluem-se uns com os outros (se bem que os querem separar à força, desintegrar tudo o que é uno para estudar as suas funções) e já não percebemos o que significa a vivência. O mundo dos sonhos? É o que nos é dado através do virtual e nos intensifica a realidade. Que significa amor e sexo? De que maneira se interpenetram? Estes são os verdadeiros conceitos da sobrevivência e da supremacia neste mundo. O desejo mais intenso que desafia a própria morte, morte que acaba sempre por vencer. A fonte de toda a complexidade do ser humano, que inventa as suas adorações e a sua adorável e fantástica cultura, que cultiva uma ideia de beleza e a faz render, tudo por momentos únicos. Momentos únicos que fazem desenrolar a história e todos os acontecimentos para esse fim. Quando o desejo urge, a morte não faz mais sentido, tal como a fome tem que ser saciada urgentemente na ausência de alimento, pois a morte é iminente, é uma questão breve no tempo. E custa-me pensar, ver e viver, imensamente, a mim - pois parece-me tão verosímil esta ideia que me surge, a do nirvana, de modo que tudo, a nossa acção, é indiferente - num mundo que desaba, o nosso mundo que seja, somente. Desabamos, o nosso sistema desaparecerá e apenas restará a nossa manifestação daquilo que fomos, aquilo que fizemos, que por sua vez poderá perdurar mais ou menos, dependendo de infinitas variáveis, dependendo se é material ou imaterial, sabendo que existirá enquanto houver cultura humana para entender a nossa acção neste mundo, e toda a nossa acção só existirá enquanto essa cultura for viável no tempo, enquanto existirem homens que nos entendam e queiram perdurar a nossa acção, a nossa obra. É urgente o nosso ensejo, o meu ensejo de construir castelos firmes neste mundo, destruir o menos possível, purificar o meu ser e a minha vida. Sei que um dia regressarei para onde vim, é urgente esse sentimento de harmonia e paz. Nasci e cresci, urgentemente, à margem de todos os conhecimentos, que agora possuo, e nunca pensei chegar até onde cheguei, nunca pensei que enveredaria por este caminho, único e sem retrocesso, que veria por um prisma diferente como hoje vejo. Pensei que a vida seria plena para mim, envolvi-me no meu interior, no chamamento de um Universo que não compreendia e que me falava, e agora o sinto tão próximo, tal como a loucura que os homens inventam, para dominarem homens. Eu tento urgentemente viver. Viver como vivo, univocamente, mas com a utopia de encontrar um elo perdido de ligação com este mundo. Urge fugir do vazio, reencontrar-me e reencontramo-nos com a sensatez, a abertura do espírito à sabedoria, à inteligência, ao bom senso, porque fazer um mundo melhor é possível, fazer com que o mundo bata seus corações em uníssono, sem destruir mais do que o necessário, sem desconfiar no sentimento que se abre, de modéstia e paciência. A mim é-me urgente a riqueza, mas uma riqueza que seja sustentável, uma vida plena de amor e bens materiais quanto baste. A ‘urgência’ nunca teve mais em moda do que agora, a urgência de se repensar o mundo, de mudanças tais que não cabem a um só homem fazer, a urgência de reparar todo o mal produzido a partir de coisas feitas para o bem, a maior parte das vezes. Urge-me a mim, o desejo de saber onde fica a fonte, ou as fontes, do bem e a origem, ou as origens, do mal, mesmo quando um dia já se seguiu o caminho da rectidão e nos perdemos. O desejo de saber e compreender é imenso, movem-se montanhas para atingir a compreensão das coisas, se bem que a maioria das pessoas segue um normal encaminhamento da vida, não vendo, porque não querem, ou porque têm medo de que aquilo que temem seja verdade, ou por outro motivo qualquer, fechando os olhos aquilo que é o conhecimento. E o conhecimento brota de toda a cultura humana, de tudo o que é possível e imaginário. E uma força brutal existe neste preciso momento, deste ano que corre, de conhecimento, e de formação de realidades que eram imagináveis há anos atrás. Urge o tempo, - e o desejo enorme de uma multidão sem nome, de algo que é indiferente a tudo o que é particular e individual -, um desejo da maioria da sociedade humana, concretiza-se, como se se transformasse numa orgia global. Será que isto é um vulcão prestes a rebentar, ou prestes, simplesmente, a expelir lava?
Observo a atitude da sociedade. Observo e analiso. E observo que a maioria das pessoas põe culpas do que sucede, alguns em tudo, e a culpa é sempre dos outros, não do próprio. A maioria das pessoas pensa que tudo os ultrapassa e que nada é da responsabilidade de cada um. Mas decerto não sabem que a sua responsabilidade existe, e é multiplicada por aqueles que têm a mesma responsabilidade, e que insistem em a ignorar por comodismo ou outro motivo qualquer. E as pessoas são imensas, com as suas inteligências cada vez mais robustas e a explorar o que a mãe terra dá a um nível terrivelmente desnecessário. Eu sinto que nasci com uma culpa imensa às minhas costas, esquizofrenicamente sinto culpa de tudo o que se passa neste mundo, como se eu fosse o centro do mundo, o que não é verdade, mas, uma coisa é certa, eu sou o centro do meu mundo, e sou terrivelmente responsável por aquilo que se passa comigo. Se a minha vida descambar, eu enquanto ser mental e corporal que sou, sou responsável pelo que a minha vida se tornar, ou se tem tornado, excluindo aquilo que não consigo controlar, e que faz parte da inter-relação minha com o mundo aos mais diversos níveis e tipos. O mundo surge-me na minha mente e compreensão como uma amálgama de pessoas e acontecimentos, surge-me como um verdadeiro caos que aparenta ter uma ordem, mas a verdade, apesar de eu sentir que é um caos, a verdade é que o mundo funciona e, provavelmente funcionará até um dia qualquer que não sei, nem sei se alguém saberá, precisar. Todos procuram o bem-estar, e o bem-estar é produzir e explorar mais, produzir mais produtos, explorar cada vez mais o mundo, ser mais que o outro, do que o próprio irmão, numa luta desenfreada e confusa, que eleva o mundo a patamares cada vez mais destrutivos. Eu não posso mudar tudo o que se está a passar, adoro o conhecimento mas abomino a destruição que isso significa. Era tão bom que este mundo fosse viável… que houvesse sempre petróleo, que pudéssemos conhecer cada recanto do mundo, cada paraíso escondido na terra, sem serem destruídos que tudo permanecesse estável; que um dia a pobreza deixasse de existir; que a comunicação fosse sempre possível nos termos em que existe hoje. Mas o mundo é feito de pólos opostos, do bem e do mal, da economia que funciona como todo o Universo, feito de extremos, de paradoxos, em que para um ou vários indivíduos serem ricos, por exemplo, significa que outros tem que fazer o trabalho sujo e sacrificarem-se para que essa nata da população do mundo esteja no topo. Por isso o mundo significa exploração, exploração do homem pelo homem. Mas, também há um ponto de vista que não deixa de ser verdade, o facto de que um homem é um ser vivo, simplesmente, e que ele procura a sobrevivência neste mundo em que nasce e que sendo assim ele tem o direito de procurar o seu bem-estar e fazer pela sobrevivência, segundo aquilo que é e fazer valer todo o seu ser para esse fim. Algumas pessoas vivem de tal modo num mundo que não sei se diria dos sonhos ou perfeição e então reclamam por tudo, como se o mundo fosse feito de direitos individuais e particulares, como se houvesse pessoas que forçosamente, tivessem mais direitos do que outras pessoas, riem-se dos outros, reclamam, escrevem no livro de reclamações por tudo e por nada, consomem imenso como se isso fosse um direito que lhes assiste, querem ser importantes. E o homem tem o direito a ser importante, isso faz parte da luta pela sobrevivência neste mundo humano altamente complexo culturalmente, mas eu pergunto que direito tem um homem de destruir outro, não procurando um ponto de equilíbrio e de mediação de umas pessoas com as outras?!
Há uma sintonia que não alcanço, e temo não poder alcançar. Há uma sintonia, uma sincronia, e há o contrário a dessicronia, a dessintonia, que ao extremo tende para o colapso. Parece tão fácil a sintonia, assim como o contrário pode ser o menos provável e o mais difícil de se sair depois de interiorizado, depois de se ter entrado nesse ritmo avassalador que é o dessincronismo. Tão fácil a sintonia, essa dança perfeita dos corpos em movimento, esse trocar de olhares perfeito, esse conjunto de melodias afinadas cantadas no momento certo com o som belo dos aparelhos, esse bater dos corações em uníssono, ganhando uma força que parece ninguém parar, essa equipa entrosada, que ninguém jamais ousará ganhar, essa orquestra afinada que produz uma música tão bela e tão complexa, esse organismo que está em equilíbrio e é funcional e que procura esse equilíbrio até não mais poder. Tão fácil essa sintonia, esse entendimento completo de um ser com outro, mas mais fascinante, entenderem-se os seres em conjunto, não só através de palavras mas de tantas outras coisas visíveis e invisíveis: os gestos, as expressões, o movimento dos seus corpos, a sua maneira de agir, o olhar – a naturalidade da gestão dos olhares – a sintonia do psíquico, a sintonia do Universo, o homem todo uno, conectado por uma ligação invisível. E a alegria é quem se difunde e propaga, esse eterno optimismo de que tudo será melhor. A tristeza, essa, que toma posse dos seres, nas suas expressões quando outro ou outros assim o demonstram é desvalorizada. Todos querem participar nas alegrias, mas as tristezas são pisadas como se o fim último da existência dos seres fosse o prazer. E todos fogem das a sete pés, como que se morrer afirmando por palavras ou um conjunto de situações ou maneira de agir que se está triste, que essa tristeza não quer largar o nosso ser, fosse uma atitude anti-sobrevivência, e logo os instintos lhes dizem aos outros, os alegres, que devem desviar-se desse buraco negro do Universo que os pode consumir. Então fugi de mim que estou triste: a luta pela sobrevivência, a lei do mais forte, o destino que se reescreve a cada momento que passa, a história só reza dos vencedores, dos vencidos rezará a História, silêncio! Que se vai cantar o fado, o fado é o destino, mas a mim ninguém me cala, mais calado do que o que estou não posso ficar, da galhofa não me hei-de livrar, mas gritai por quem não tem voz.
Há uma emotividade que não consigo compartilhar, e temo não conseguir fazê-lo, jamais. Mas a esperança é a última a morrer, e tento contornar esta solidão que me açambarca.
Sim, sou eu que estou off, desligado do mundo. (pergunto se tereis coragem de me fornecer um cabo para me ligar?) Sim, sou eu quem vai sair derrotado, como se a minha vida fosse uma luta, que me parece ser mais de mim contra mim próprio do que propriamente contra alguém, esse alguém que se dilui no espaço e no tempo, os meus inimigos, imaginários ou não, ou apenas aqueles que simplesmente, não podem ou não querem compreender ou ceder. Eu vejo como vejo e isso faz quem sou, apesar desta busca incessante por uma identidade que seja uma máscara para poder viver mais uns tempos. Sim, sou eu que pareço certo e estou mais errado do que qualquer homem que está à face desta terra. Vou cair por terra, sei-o, vou desfalecer e não poder lutar. Sou homem, e a energia falta. A fogueira da incompreensão quer consumir-me. (serás capaz de me dar a mão?). Vão atribuir-me motivos para o que se passa, mas decerto todos vão errar. E vou viver. Quer viva anos ou meses, ou dias ou horas, ou minutos ou apenas segundos e segundos que parecem não ter fim. O fim está traçado, tudo é em vão quando não há elo de ligação, sintonia. Só me restará o sofrimento? A lamechice de mim para mim próprio? Chamem-lhe pessimismo, trauma ou o que quiserem, depois de morrer, já não me interessará, mas agora o que se diz afecta-me tão rapidamente como se eu fosse um boneco nas mãos de uma criança, incerto como uma pena ao sabor do vento. Digam o que disserem nada me vai mudar, pelo menos para já, porque, mais uma vez, a esperança é a última a morrer… dizem.
Impeçam o impossível. Impeçam a dor e a morte se forem capazes. Impeçam-me se forem capazes desta tristeza, ainda por cima gozada, e carregada com adjectivos de destruição, aqueles que atiram pedras a quem já está moribundo, ou então regozijai-vos por teres feito quase nada, em nome de vós.
<< O poeta é um fingidor. E finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente. >> Fernando Pessoa
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