Discorrendo
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Esta vida é uma melodia. A minha vida é uma pauta. É a música. Aquela que me entretinha, com que me distraio, com que perco o meu senso, com que devaneio, com que me acalmo. A minha companhia, a minha esperança, o meu esconderijo. Os sons que nascem, os sons que permanecem, os sons que enriquecem, os sons que são um móbil da evolução, os sons da salvação, a conexão, ao mundo e aos homens. Ela foi, é, e será, a música, mas eu, jamais serei o mesmo, a partir do momento que me pertencerá. A minha pobreza, o sonho, tudo pus nela, em partituras da minha vida, como se em lotarias e euromilhões estivesse a jogar. Na verdade, não sei se fui eu que nasci para ela se foi ela que me aprisionou. Ela é tudo, como tudo o que vem do nada. A invenção, que se torna num vício, como uma droga, que nos destrói pela sua ausência, tal estamos viciados nela, que nos destrói se continuamos a utilizá-la. E uma coisa é certa, o efeito que tem, ninguém o pode negar, se bem que se pode ignorar. Ela é uma outra forma da expressão, a expressão que eu nunca tive. Eu senti-a, mesmo antes de a ver, eu me envolvi com ela, sem querer, nas malhas de palavras e emoções tecidas que desconhecia, num mundo de silêncio que me envolvia. E, eu, estava ali, sozinho, como, um dia, todos hão-de estar, olhando o céu, adivinhando, que algo havia para alcançar. E, eu, e a minha amiga, que me eleva e me abisma, sem ela não posso passar. E, eu, a chamo, para que me dê asas, que me faça voar mais além, porque atrás não podemos voltar, e o caminho é difícil de percorrer. E, eu, a oiço, como um cego, à procura de um ruído que o guie, de um som que o oriente, de uma palavra estridente, o pop do ocidente, um ponto cardeal, o norte ou o poente, como se fosse uma nascente. Nem só de sons vive o homem que vê, mas quem não os produz, imagina, canta em seu interior, o seu mundo levanta. E as horas ultrapassam-se, naquelas vozes únicas, desfazendo fronteiras, com energia invisível, onde o pensamento chega a imiscuir-se e a confundir-se com espaços infindáveis, onde, os olhos tocam, mesmo sem saberem o que é. Então, tudo rejubila! A magia torna-se real! A fluência do amor é sentida, há paixões desmedidas, o dia torna-se bonito, como bonito é aquilo que é novo e nos fascina. A voz como que surge, sou eu que estou ali, a pessoa que canta, sabe os meus sentimentos. Quem será que canta? Afinal, os passarinhos cantam e a água cai em catadupa - as cataratas -, o vento sopra. E o silêncio é música, a música que já esqueceste ou que nunca conheceste, que todos terão de aprender, viva quem viver, de manhã ou ao entardecer. Tudo é possível enquanto houver fontes a brotar, mas a seca também pode chegar. Para quê abafar com gritos quem não se quer ouvir? O som e o ruído estão no mesmo nível, então apura o ouvido, eu vou tentar fazer o mesmo.
Rastejando, serpenteando em busca do inalcançável. É o desejo que nos move, é a incerteza de que alguma vez o vamos encontrar que nos angustia. É uma busca incessante, uma compreensão que não cessa, é o mistério que se adensa, é o tempo que desgasta, que mata. Esvanece-se a esperança, aumenta a clarividência, como se a verdade estivesse cada vez mais próxima, estando, na verdade, cada vez mais distante. E falo de coisas grandes, do invisível, do simples, do invisível, mas tangível. Porque tudo tem de ter um tempo, porque tudo o que é bom tem de ser passageiro? Porque rastejo, em busca daquilo que me foi negado, como o ar que respiro? Atabafado, no meio de tudo, feio e bonito, bom e mau, cego. Mas os sentidos apuram-se e a fraqueza apodera-se como se os recursos fossem cada vez mais escassos. Dói aqui, ah! E agora ali também, ah! Mas tenho de seguir, não posso parar. Ninguém pode parar, mas… eu sinto tudo a fugir, cada vez parece que mais compreendo, mas cada vez sei menos, e busco os meus instintos a cada hora que passa, numa aflição que não passa, e já não sinto. Serpenteio entre tudo o que me tenta bloquear o caminho, em busca do objectivo desejado. Será que alguma vez tive objectivos? E que meios eu tenho para os atingir?
Só há uma certeza, a de nos termos a nós próprios, a de me ter a mim e eu mesmo, de ambicionar um objectivo que nunca deveria ter desejado, de ter uma vida que não se compreende, de ter algo quer parece incontornável. Até parece que sim, por vezes estamos no topo, mas temos que vir cá abaixo para respirar. E fazendo a revisão do que sentimos, vamos de encontro aquilo que somos. Realmente há um destino, escolhamos o caminho que escolhermos, ele fala mais alto, e desafia-nos a lutar contra ele a todos os momentos. Pois, mesmo que vivas 1001 anos jamais ele será vencido. Pois, faças 1001 personagens, a verdadeira personagem prevalecerá.
Rastejando entre flores e ervas verdes. Rastejando em terreno pedregoso. Mas sempre rastejando, como se um castigo tivesse a cumprir, sem nunca ter cometido algo de que se possa alguém arrepender senão o de ter nascido, em busca de amor, como se alguma coisa faltasse para tudo estar bem. Não, ninguém é a personificação daquilo que se almejou, no mais fundo do ser, a essência, o potencial que vem desde lá do principio, mesmo antes de ser. Inspira, como se fosse a última vez, tenta respirar, como se alguma vez o fizeste. Eu faria alguma coisa por…, eu faço tanto por…, o vazio de…, a plenitude da contradição, a frustração de um sonho que nos persegue, o estar aqui eu e estares tu, frente a frente, o diálogo que faz sentido para alguém, aqueles que se perdem nos meandros da palavra, como se fosse magia, algo que desaparece e aparece do nada. E tudo em busca da linha recta! E tudo há procura da onda! E tudo confuso e preguiçoso, a não querer deixar os instintos. Ah! Se houvesse outros caminhos senão os da vulgaridade! Então olha nos meus olhos, hipnotiza essa serpente que te aborda e te mostra a sua língua bífida, ela não é perigosa, apenas o seu destino é esse, ir sempre até ao fim rastejando. E o objectivo será cumprido. Doa o que doer.
E o sol brilha depois da tempestade, ela é passageira, mas a devastação é enorme, mas aquele ser rastejante ainda lá anda. Como é possível? Como não se afogou? O Objectivo é pertinente. Foi tudo em vão! Terei que recomeçar de novo. Uma nova oportunidade para nos sentirmos vivos outra vez. A quem vais pertencer desta vez? Ao silêncio do Universo? À beleza do nirvana? Ao brilho eterno de uma estrela enquanto durar? Ou vais pertencer a ti próprio e saber que não tens fim e tudo foi como foi, e que resta apenas o que subsistir. Lindo começo de dia, magníficos amanheceres, grandes sentimentos, brandos como o entardecer, eternos segredos que jamais alguém irá desvendar. O campo floresce novamente, como se tudo fosse imutável, mas já nem me repito, para não dizeres que sou chato. Esperança, fé, envolvimento, burla, engano, culmina a paixão, derrete-se o gelo, tudo tem tradução no manual das eternas palavras. E penso que volta hei-de dar, para não voltar ao mesmo lugar.
Afinal, sou, só um, homem, a rastejar.
"O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons".
Martin Luther King
Estou no silêncio da tarde. Em silêncio parece ser onde eu me sinto bem, onde o meu feitio de solitário tem vazão, onde eu me consumo prazenteiramente como um masoquista, que só a sofrer se sente bem. Eu bem luto contra isto, mas parece-me que as forças antagónicas são mais potentes. Como alterar uma edificação que já está construída? Só destruindo e começar de raiz. Quanto a modificações que se lhe podem fazer, serão só remendos. Cheio de remendos – e cada vez mais – estou eu. Remenda num lado, rebenta no outro. Os remédios talvez me estejam a fazer mal com os efeitos secundários e chegarei a um ponto que serão por demais evidentes e destruidores. O ‘Z******’ é potente. Ele faz-me por um lado reprimir os efeitos positivos que sentiria, psicologicamente, no meu cérebro. Mas nem por o tomar há já mais de quatro anos eu sinto que vou ficar bom, apenas me sinto mais lúcido em relação há doença que me consome. E os efeitos positivos seriam os de andar num descontrolo mental enorme, mas nem por os tomar eu algum dia serei novamente uma pessoa normal, eu prevejo isso e não quero andar na ilusão, se bem que isso me entristece imenso. O ‘z******’ actua quimicamente no meu cérebro, e decerto já provocou grandes afectações nele. Se por um lado me faz algo de positivo, também me faz muito de negativo. E faz de positivo quando me acalma e me faz aguentar certos momentos mais difíceis que sei que se não o tomasse, me iria abaixo mais depressa, porque eu tenho um feitio depressivo. E ele faz-me dormir, é bom, mas durmo demais. Durmo de mais porque a maioria das vezes não sinto motivação para o que quer que seja, a apatia é enorme, além da falta de energia que perdi, como que se tivesse evaporado, a partir daquela tarde de Novembro de 2000 – se não me engano no ano, em que subitamente desisti de tudo, e entrei em paranóia. Esses dias foram difíceis: Não tinha consciência do que se estava a passar comigo, deixei o emprego, como se quisesse fugir do mundo e de todos os meus medos, e a verdade é que nos meses que se seguiram, tudo se tornou mais difícil ainda, em casa: o descontrolo químico do meu corpo atingiu o auge, e o mais de ano e meio que se seguiu foi de queda até ao abismo, a solidão extrema, a confusão sem fim, a incompreensão do que se estava a passar comigo e com o que me envolvia e do que directamente ou indirectamente me afectava – Quase quatro anos passados desde que eu comecei a trabalhar na noite, num trabalho que eu penso ter sido arranjado por intermédio de Deus (em quem eu desacredito cada vez mais na maneira em como a religião o vê, e acredito na minha maneira de o ver como a mais certa) eu melhorei em muitos aspectos. E ai o z****** ajudou-me a aguentar um bocado todo este trajecto, não só ele mas também. Passados quatro anos vejo que perdi muita coisa, coisas que não devia ter perdido para ser uma pessoa normal, e vejo que pouco ganhei, o meu equilíbrio é muito sensível ainda. E o z****** ajudou-me nesse aspecto de abrir os olhos. Mas o trabalho também. E a noite também (dizem que a noite sempre foi boa conselheira e eu afirmo veemente isso). Aquele silêncio e mais calma que são inerentes a ela deram-me um bocado de fôlego para que pudesse vislumbrar aquilo que me prende e não me deixa evoluir. Mas os efeitos negativos do z****** não se deixam de sentir, e sei que por vezes se misturam com os efeitos negativos do próprio problema, a minha doença, que talvez seja esquizofrenia. A apatia tem aumentado e a falta de energia também, a minha capacidade de reacção aquilo que passa à volta de mim é cada vez menor. Tendo a desconfiar, cada vez mais, que é do remédio. Estou a meter-me num ciclo de isolamento cada vez maior, o meu equilíbrio é subtil. Só o remédio não vai trazer-me a sociabilização que me faz falta. Como posso eu socializar se eu sou uma nulidade social? Se eu não me exprimo? Se eu não tenho motivação social?
Sei que tudo isto pode ter começado lá bem no princípio da minha vida. A minha timidez natural foi cada vez tornando-se maior até se tornar no monstro em que está agora. Já pus a culpa ao meu pai. A minha mãe também terá a sua culpa. E a verdade é que me criei num ambiente que me tornou assim, calado. A afectação do meu raciocínio sei que cada vez é maior, e tenho medo do que possa vir a acontecer, ou seja: piorar. Eu tenho medo de falar. A repressão sobre a minha expressão, qualquer que seja o meu tipo de expressão, mas sobretudo no falar, é enorme. E o z****** não me irá curar este grande problema, ele paralisa-me ainda mais a fala, ele paralisa-me ainda mais o raciocínio. O z****** abre-me o apetite também, por isso a minha tendência é cada vez mais a de engordar. Precisava de acreditar em alguém, se houvesse alguém que na realidade me quisesse fazer bem.
z******=zyprexa
P.S
Ficam as questões:
Trata-se a Fobia Social ou as Ansiedades Sociais com remédios tão potentes? Será mesmo necessário ser assim? Pressupõe-se, logo á partida, que a pessoa necessita mesmo do tratamento mais radical? Querem mesmo pôr uma pessoa funcional com estas drogas, quando as deixam ainda mais disfuncionais? Que grande confusão de Mundo, que Grande entropia de informação nestes dias, a quererem resolver as coisas da maneira mais estúpida ...
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