Rastejando
Rastejando, serpenteando em busca do inalcançável. É o desejo que nos move, é a incerteza de que alguma vez o vamos encontrar que nos angustia. É uma busca incessante, uma compreensão que não cessa, é o mistério que se adensa, é o tempo que desgasta, que mata. Esvanece-se a esperança, aumenta a clarividência, como se a verdade estivesse cada vez mais próxima, estando, na verdade, cada vez mais distante. E falo de coisas grandes, do invisível, do simples, do invisível, mas tangível. Porque tudo tem de ter um tempo, porque tudo o que é bom tem de ser passageiro? Porque rastejo, em busca daquilo que me foi negado, como o ar que respiro? Atabafado, no meio de tudo, feio e bonito, bom e mau, cego. Mas os sentidos apuram-se e a fraqueza apodera-se como se os recursos fossem cada vez mais escassos. Dói aqui, ah! E agora ali também, ah! Mas tenho de seguir, não posso parar. Ninguém pode parar, mas… eu sinto tudo a fugir, cada vez parece que mais compreendo, mas cada vez sei menos, e busco os meus instintos a cada hora que passa, numa aflição que não passa, e já não sinto. Serpenteio entre tudo o que me tenta bloquear o caminho, em busca do objectivo desejado. Será que alguma vez tive objectivos? E que meios eu tenho para os atingir?
Só há uma certeza, a de nos termos a nós próprios, a de me ter a mim e eu mesmo, de ambicionar um objectivo que nunca deveria ter desejado, de ter uma vida que não se compreende, de ter algo quer parece incontornável. Até parece que sim, por vezes estamos no topo, mas temos que vir cá abaixo para respirar. E fazendo a revisão do que sentimos, vamos de encontro aquilo que somos. Realmente há um destino, escolhamos o caminho que escolhermos, ele fala mais alto, e desafia-nos a lutar contra ele a todos os momentos. Pois, mesmo que vivas 1001 anos jamais ele será vencido. Pois, faças 1001 personagens, a verdadeira personagem prevalecerá.
Rastejando entre flores e ervas verdes. Rastejando em terreno pedregoso. Mas sempre rastejando, como se um castigo tivesse a cumprir, sem nunca ter cometido algo de que se possa alguém arrepender senão o de ter nascido, em busca de amor, como se alguma coisa faltasse para tudo estar bem. Não, ninguém é a personificação daquilo que se almejou, no mais fundo do ser, a essência, o potencial que vem desde lá do principio, mesmo antes de ser. Inspira, como se fosse a última vez, tenta respirar, como se alguma vez o fizeste. Eu faria alguma coisa por…, eu faço tanto por…, o vazio de…, a plenitude da contradição, a frustração de um sonho que nos persegue, o estar aqui eu e estares tu, frente a frente, o diálogo que faz sentido para alguém, aqueles que se perdem nos meandros da palavra, como se fosse magia, algo que desaparece e aparece do nada. E tudo em busca da linha recta! E tudo há procura da onda! E tudo confuso e preguiçoso, a não querer deixar os instintos. Ah! Se houvesse outros caminhos senão os da vulgaridade! Então olha nos meus olhos, hipnotiza essa serpente que te aborda e te mostra a sua língua bífida, ela não é perigosa, apenas o seu destino é esse, ir sempre até ao fim rastejando. E o objectivo será cumprido. Doa o que doer.
E o sol brilha depois da tempestade, ela é passageira, mas a devastação é enorme, mas aquele ser rastejante ainda lá anda. Como é possível? Como não se afogou? O Objectivo é pertinente. Foi tudo em vão! Terei que recomeçar de novo. Uma nova oportunidade para nos sentirmos vivos outra vez. A quem vais pertencer desta vez? Ao silêncio do Universo? À beleza do nirvana? Ao brilho eterno de uma estrela enquanto durar? Ou vais pertencer a ti próprio e saber que não tens fim e tudo foi como foi, e que resta apenas o que subsistir. Lindo começo de dia, magníficos amanheceres, grandes sentimentos, brandos como o entardecer, eternos segredos que jamais alguém irá desvendar. O campo floresce novamente, como se tudo fosse imutável, mas já nem me repito, para não dizeres que sou chato. Esperança, fé, envolvimento, burla, engano, culmina a paixão, derrete-se o gelo, tudo tem tradução no manual das eternas palavras. E penso que volta hei-de dar, para não voltar ao mesmo lugar.
Afinal, sou, só um, homem, a rastejar.