Sobre Deus e religião- comentário e reflexão, feito a um amigo
Olá Pedro. Antes de mais, não sou padre, sou uma simples e às vezes reles pessoa, que me limito a pensar, porque o pensamento não pode parar. Há no teu texto uma promiscuidade de ideias, que por vezes tendem a ser antitéticas, isto é, entre o não querer aceitar o conceito de Deus e ao mesmo tempo não o poder negar. Mas acho que isso se passa com muita gente que é confrontada com essa problemática. E acho que compreendo essa atitude, porque há uns anos atrás eu a tive também. Eu fui e senti-me confrontado - dadas as minhas raízes cristãs católicas, provavelmente como as tuas, onde se impõe uma ‘cartilha’ em que temos que acreditar cegamente, com conceitos estereotipado de Deus, como se Deus fosse como eles o querem ‘pintar’- a partir de certo ponto da minha vida, em que não cabia em mim essa concepção de Deus. E a verdade é que já pensei bastante sobre isso mas nunca encontrei respostas definitivas. Consegui, sim, aproximar o conceito que alguém me deu a entender de ‘Deus’ ao meu ideal do mundo e do Universo, segundo o que sei e a forma como sinto, mas nunca consegui negar que Deus não existe (tal negação seria a negação de quem sou). Aceito que provar a existência de Deus é algo impossível se o considerar - mos como sendo algo concreto, como a religião cristã (ou outras) o tenta (m) fazer (pelo menos passam essa ideia). Assim, não haverá algo concreto a que possamos chamar Deus, algo a que possamos atribuir uma representação, tal como o fazes quando chamas 'pedra' a uma pedra, tu mesmo o dizes por outras palavras. Deus, definitivamente para mim, não é um ser humano superior, nem tão pouco um ser humano ou animal ou qualquer coisa em particular. Eu considero-o como sendo uma entidade metafísica que se manifesta em tudo o que existe, seres vivos e não vivos, a natureza, o mundo e o Universo no geral. Eu e tu somos uma ínfima manifestação dessa entidade, no plano corporal(como sistema humano que somos no geral, como tendo células, esses sistemas básicos do nosso organismo, que por sua vez têm constituintes ainda mais básicos e Universais como sejam os constituintes bioquímicos e, em última análise, o átomo e os seus constituintes), assim como no plano metafísico (o nosso pensamento e o mundo das ideias). Como entidade metafísica que é, a esse ‘Algo’, podemos chamar entidade superior. [Nós somos, além de seres físicos, entidades metafísicas, temos um pensamento, ideias, uma alma]. Deus não é ‘uma criação humana’, como dizes, mas a palavra ‘Deus’ é-o, e refere-se a um conceito que tendemos a construir com o passar da vida. E, sendo assim, a palavra ‘Deus’ é um Nome, que tenta transmitir um conceito em constante enriquecimento, a que os homens, desde sempre, atribuíram a ‘Algo’ que sentiam e não compreendiam - a eterna questão do sentido da vida, o porquê de estarmos aqui e qual a finalidade de tudo - e que ainda, apesar de se ter cada vez mais conhecimento, ainda não compreendem. É obvio que o nível de entendimento das pessoas em relação ao conceito de ‘Deus’ varia muito, segundo a cultura, inteligência, sabedoria e a liberdade que se tem. Por isso algumas pessoas não passam de ‘beatas’ e ‘ovelhas do rebanho’, porque a sua compreensão não dá para mais (e ainda bem para ti que tens a hipótese de ultrapassar todas essas pessoas em compreensão de Deus e do mundo, e tens a liberdade para não acreditares em Deus, se quiseres, e se a tiveres…). E mesmo que não queiras pertencer a nenhuma religião (que, possivelmente, te está a ser e foi imposta, como a mim) até podes acreditar em Deus, podes concebê-lo segundo o que és em relação como que te envolve. Mas uma coisa é certa, mesmo que não acredites em Deus, vais tentar atribuir na tua vida, àquilo que se passa contigo, que sentes e não compreendes, a ‘Algo’, seja isso o que quer que seja, não podes ignorar o que sentes. E esse ‘Algo’ será a resposta das respostas que encontrarás: a tua visão do mundo, o que sabes, o que vais saber, o porquê das tuas alegrias e tristezas, coragens e medos. Tu não irás ficar indiferente às tuas questões. Olha, eu não fiquei, em relação às minhas. Ainda bem que posso atribuir um Nome às minhas inquietações, questões, dúvidas, sofrimentos, alegrias, e àquilo que me liga à humanidade e ao Universo no geral.
Um abraço.