Enfeitado , disfarçando; traduzindo: as horas, o tempo que passa, inexorávelmente, e sentindo os sentidos da minha vida e de tudo e todos os que minha alma toca e abrange. Bem vindos a este meu Universo.
Enfeitado , disfarçando; traduzindo: as horas, o tempo que passa, inexorávelmente, e sentindo os sentidos da minha vida e de tudo e todos os que minha alma toca e abrange. Bem vindos a este meu Universo.
Estou do lado de lá. Dou comigo constantemente desse lado onde a minha voz ecoa sem rival, de onde quero sair sem encontrar uma porta definitiva que me tire desse labirinto em que me meti, sem querer e sem perceber como é possível tal. Sem perceber, pelo menos por enquanto, como quem procura uma causa da coisa mais improvável que possa acontecer. Estou desse lado onde sei mais do que ninguém quem sou, onde me vejo e compreendo completamente – ou pelo menos tendo sempre para isso -, onde vejo o meu passado e me identifico com o que fui – o passado e só o passado, como que o presente estivesse a deixar de existir e o futuro não quisesse mais vir -, onde verdadeiramente sou eu, onde tenho um lugar – desse lado – mas que nada significa quando existe tamanha incomunicabilidade com o lado de cá. Estou num Universo paralelo onde tudo é razão, desse lado onde as emoções não moram, onde vejo sorrisos que quero retribuir mas que neste vazio não existem, onde vejo desequilíbrios que quero corrigir, mas não consigo, porque as forças faltam-me, como se em mim algo me anulasse a mim próprio, como se estivesse a ficar paralisado, paulatinamente, como se me faltasse o ar que necessito para respirar. Desse lado onde, na verdade, os gestos, os rostos e os olhares não significam nada, para mim, como se em mim tivessem sido apagados os significados naturais de tudo isso, se é que alguma vez os tive. Gostava que algumas pessoas soubessem quem sou. Não sei quem deveriam ser essas pessoas. Gostava que elas conhecessem o meu lado da vida. Gostava que me levassem a conhecer o lado de cá da vida, de que tanto oiço falar e vejo virtualmente sem conseguir sentir. Mas é difícil estar do lado de cá, sentindo desta maneira, sentindo da maneira do lado de lá. Eu perco-me e descontrolo-me, eu sinto-me a apagar, cada vez mais pequeno, a ficar sem liberdade como se não fosse livre de respirar. E então, quando olho para os rostos do lado de cá, eu não vejo nada do que eles devem estar a transmitir, nada me dizem esses rostos e esses olhares, como se deixasse de pensar, como se tivesse estado toda a vida preso dentro duma masmorra sem ver gente, como se tivesse sido um autista – tenho medo de me tornar um autista -, a verdade é que não consigo olhar. Do lado de lá há apenas monólogos. E se desse lado de lá tudo pareço compreender, do lado de cá nada pareço entender, como se fosse tudo fugidio. Sei que houve um princípio para isto, alimentado pelo tempo que passou, como se fosse uma corrente que algo ou alguém me pôs e que não foi quebrada com o tempo, mas sim foi reforçada. Vejo muitos momentos desse reforço negativo, vejo-me muitas vezes a querer fugir daquilo que devia ter encarado de frente. Vejo que interpreto como negativo muito do que me acontece. Não contrariei essa força que me levou cada vez mais para esse lado de lá. E novamente resta o sentimento da esperança, que tudo seja menos mau, já que mau parece que tem de ser. Sei que falo da minha dor e que deve parecer que falo como se ela fosse absoluta e única e como se não fosse capaz de ver a dos que me rodeiam. Mas eu vejo e sinto-a, eu absolutizo na minha dor, a dor dos que me rodeiam, porque essa dor dos outros não me é indiferente, e não sei porquê isto. Porque não absolutizarei a alegria que há nos outros e tenho que absolutizar a dor, é uma questão que me coloco neste momento. Porque não poderei ser um ser equilibrado, pelo menos? E, entre estar do lado de lá ou estar do lado de cá, entre querer as duas coisas ao mesmo tempo, é como estar no reino da contradição, do paradoxo. Entre querer ter atenção em tudo o que me rodeia e controlar tudo, do lado de lá, e querer estar concentrado e deixar – me levar ao sabor do Universo do lado de cá, vivo numa situação de instabilidade e de implosão. Mas se isto dependesse de uma simples escolha, eu já teria escolhido, viria para o lado de cá, porque estou farto do lado de lá. Mas o problema é que eu não sei viver deste lado e tenho que ir aprendendo, se me for permitido, sem no entanto deixar o outro lado porque isso seria perder-me.
Começo discorrendo, como sempre. O Universo já me conhece. Mas acho que as pessoas ainda não. Em que acredito já não me interessa, muito menos interessará a alguém. E é esse mesmo, alguém, que me tenta caracterizar de néscio. Mas, néscio, eu não sou, não me considero tal, apenas poderei ser, sei lá, apático, aparentemente indiferente. Indiferente como quem aceita o seu destino, cada vez mais. Indiferente como quem perdeu a capacidade de reagir, como quem compreende, muito, e nada pode fazer. Nascido na escuridão, crescendo e vivendo na sombra, talvez a esperança seja o móbil último da existência, aquilo que me move, e já nem falo pelos outros. Mas não tenho que morrer na sombra, morra como morrer. E já não há revolta que dê a volta ao que não tem volta a dar. Por isso silêncio - me. As vozes submergidas não têm direito a manifestar-se. O conhecimento não faz sentido, se o feedback do mundo não chega ao nosso espírito. Há que mudar de paradigma, mas até os paradigmas se perdem. É um desencontro constante. E nem que atinja o infinito, jamais passarei de um homem. Homem sobre homem. Pedra sobre pedra. Que restará de mim? Que será feito da minha moral, dos meus desejos e do meu ideal? Será um erro partir? Ou sê - lo - á ficar? Irá o mundo acabar ou irá continuar? Não me compete a mim dizer algo sobre isso, mas cabe-me questionar também. Tudo é como se vê, como se vê na globalidade do alcance da nossa visão, quer na nossa acuidade ocular, assim como na acuidade espiritual, e simultaneamente nada é. Para tal eu fecho os olhos, ignoro, abro a minha alma, perco-me nos sentidos, como se ainda os tivesse. Mas tenho, a minha mente alcança-os. E estes cultos, tudo o que me leva a estar do outro lado do muro transparente onde oiço, vejo, e não posso participar, esta tortura de receber sem ter espaço para dar segundo o que sou, esta incapacidade de retribuir, de fazer parte do clã, da união. Este culto da imagem e da personalidade e das palavras… não sou capaz. Acreditar é preciso, um lema que não me convence, como de uma promessa eleitoral se tratasse. A humanidade pode, há que acreditar. E a verdade é que não há humanidade, há homens e homens e homens sem fim, até ao fim deles. Há um elo, e há uma voz que se levanta mais alto. Nós, surdos, passamos o tempo a arranjar explicações para o que nos acontece, procuramos a causa do efeito, brincamos com a causa para ver efeitos. Procuramos os culpados, também, como se os houvesse. Simplesmente soltamos o homem que há em nós de alguma forma, de algum modo quando vivemos mais um dia, nem que esse dia seja num calabouço onde a alma está presa, presa em mim. E o perigo é real, não é imaginário. Pensamos que percebemos, mas não percebemos, é-nos dado a perceber em determinados momentos como a água que nos dessedenta, essa sede de perceber, até o orgulho fazer-nos esquecer quem somos. Eu sei, eu estou errado, só tento soltar o homem que há em mim, discorrendo.
Para mim, a vida é: uma energia que vacila mas não cede, como uma vela bruxuleante, que dura até ao fim do pavio, depois de consumida a cera que lhe dá a força da existência; tudo o que podemos alcançar, física e psiquicamente, o que podemos tocar, ou quando não, imaginar que tocamos; onde estamos ou onde podemos ir; aquilo que conhecemos ou podemos conhecer, estando lá ou sem nunca ter lá ido; é um sonho sem fim; uma aventura, onde ser quem somos - os aventureiros - é-nos definida por cada passo que damos, o caminho dessa aventura, como se houvesse um destino, trilhemos o caminho que trilhar - mos. Talvez no homem, que tem sentimentos conscientes (e tem consciência da própria vida, talvez como nenhum outro ser), as emoções sejam o condimento dessa vida. Assim, o contentamento e a tristeza fazem parte de todos nós, tanto que acho que só conhece a alegria e o contentamento quem já conheceu a tristeza. Perscruta o teu interior e procura o teu contentamento.
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