INVERNO DE 2005
O frio tem sido muito nestes dias. O Inverno está no seu pico. O Inverno, a sua sombridão, já me disseram muito respeito, os meus sentimentos já foram muito influenciados por ele. Influenciados por ele e por muita coisa mais., incontáveis coisas. Mas talvez já não seja o frio que me traz aqui, esse fascínio pelas coisas da natureza tende a desaparecer, aliás, o fascínio das coisas exteriores ao meu ser tende a desaparecer. Talvez por que seja introvertido, talvez por algo mais, mais profundo e intangível. Talvez por uma “doença”, nas palavras de outros, um conceito demasiado pesado e que amarra uma pessoa, como um cadeado.
Cada vez as questões são mais, as ideias são mais e ao mesmo tempo desconexas. Elas aparecem por flashes, não têm continuação. Vêm e rapidamente desaparecem. O sentido emocional delas (das ideias) existe pouco tempo. A capacidade emocional que daria vida a essas ideias e as faria fluir coerentemente deixou de ser eficaz. A ligação emocional, em sociedade é das coisas mais fantásticas que existe, o absorver as energias sociais que nos envolvem, sentir o fluir dos sentimentos, ser capaz de transformar todo esse envolvimento, nessa ligação, em algo concreto e novo e ser capaz de influenciar esses que nos envolvem. A perda dessa capacidade de ligação, dessa sintonia com os outros é um problema a que se deve dar atenção. É – se rotulado imediatamente de doente, por aqueles a quem se chamam de ‘normais’. Mas não sei ainda se haverá regresso ao que se foi, uma vez transpostas certas barreiras.
Os meus ideais vão contra os do mundo em muitos e muitos aspectos. Redescubro, a cada dia que passa, a verdadeira dimensão da minha maneira de ser anti – – social. Mas isso tem uma razão de ser, essa minha maneira de ser tem uma causa, o facto de que o ambiente social que me envolve tenha atentado contra o meu ser (indirectamente que fosse), daí a minha atitude anti – social. E eu estou contra esta sociedade que cria injustiças e que atropela todos aqueles que não conseguem acompanhar o seu ritmo. O respeito já não existe neste mundo do ‘faz ver’. Estão uns a passar por cima de outros. Não é que eu queira uma sociedade em que seja em tudo igual, a diferença há – de existir sempre. Mas gostava que existisse o respeito pelo homem que é mais fraco ou que defende outros ideais, isso seria liberdade. Mas se bem que não se mata fisicamente os outros, há no entanto, uma forma muito mais refinada de os matar, vivos fisicamente mas mortos psicologicamente. E essa forma é a da estupidificação do homem, que vive a acreditar que o mundo é o que certos homens, que descobriram certos poderes, contam e fazem parecer. Querem fazer ver a esses estúpidos zombies, que o que se vive noutros lugares é que é o verdadeiro viver, que o sexo que eles mostram é o verdadeiro sexo, querem pôr todos os homens a sonhar, e põem – nos de tal modo que esses homens estupidificados não vêem que a terra que os envolve está a desabar.
A luta pela sobrevivência e bem – estar tornou-se em algo mais refinado. E isso faz-me pensar no poder da palavra e da imagem. Mas penso também em algo mais, alguém poderá controlar tudo o que se passa no mundo? Serão certos homens responsáveis pelo que se passa no mundo ou poderemos dizer que o homem não pode ser responsabilizado pelo que faz visto ele agir segundo imensas variáveis que o fazem agir? Será possível saber se esses homens a quem homens lhe deram o poder agem com consciência do que estão a fazer ou agem pela ambição instintiva de controlar os outros, como meio da sua própria sobrevivência até, ou ainda, agem para provar a eles mesmos de que têm um grande auto – controlo, visto cada homem precisar de se sentir aprovado pelos outros o seu coerente auto – controlo e mesmo sabedoria?
Uns viram-se para o exterior e descobrem o que os envolve e outros viram-se para o interior e descobrem quem são na verdade, e acho que ambas as atitudes devem conduzir a um mesmo fim, à descoberta de que o Universo exterior será idêntico ao Universo interior. O Universo exterior será gerido por Deus. E esse mesmo Deus deu-nos o Universo interior para nós gerirmos. As coisas exteriores dizem respeito a Deus que tem o poder de regular as coisas interiores também, e nós poderemos mexer nas coisas interiores apenas, já que as exteriores nos transcendem. O que poderemos fazer exteriormente a nós é uma contingência de Deus, por isso todas as coisas exteriores são passageiras, mas acho que a nossa energia interior é a coisa que perdurará nos confins do Universo exterior, o Universo não será o mesmo com a nossa (boa) existência interior, quero acreditar nisso.
Tudo tem uma razão de ser. Muitas das vezes ficamos irados com o que se passa, mas sem razão. E toda essa ira só nos trará frustração e mal-estar. Talvez eu seja uma vítima da minha própria ira não projectada no exterior. Talvez eu seja vítima de muita coisa passada à qual já lhe perdi o conto. Talvez eu seja o bode – expiatório, mas ainda continuo a resistir, apesar de tudo (por quanto tempo mais?). Forte não é aquele que opera grandes mudanças sem oposição, forte é aquele que, apesar do peso que tem em cima, consegue escalar a montanha e ir contra o próprio peso. Eu fui forte, se ainda não o sou, por causa da oposição, eu sem consciência fui contra tudo, porque acreditei que estava certo no meu ideal. Sei que certo não estaria completamente, talvez longe disso, mas decerto bastante certeza tinha.