Dia Glorioso
Neste Dia Glorioso, que nasce com todo o seu esplendor, entro no cubículo da minha alma, onde mora a minha dor. Este sítio recatado, sombrio e frio, onde eu moro e tenho vivido grande parte dos meus dias, nunca ninguém lá entrou, ninguém me conhece. Por uma janela, plena de esperança, raiam com fulgor alguns fotões que penetram ao fundo do espírito demonstrando uma esperança cada vez mais débil, assim, como o passar do tempo. E eu daqui, altivo como um Deus, no abismo mais profundo, renovo o meu sentir, alargo o meu olhar. Eu estou firme no meu posto, mas vacilo a cada passo que tento dar, como se cego eu fosse. Sei que o meu Dia está próximo, fujo dele a 70 vezes 7 pés, mas ele cerca-me para onde quer que eu me dirija. Trago o trunfo na manga, aquele que eu estarei prestes a deitar, quando a vida me quiser completamente sufocar. Trago a noite do Universo num dos meus bolsos, aquela imensidão que me há-de acalmar, o dia terreno que é límpido e colorido no outro, para alvarmente me cobrir e a tua conduta enganar.
Por ti estou aqui, hoje. Sim, por ti. Por tua causa eu estou aqui, agora, Glorioso como o despertar, rarefeito como o sol – pôr, momentos únicos que jamais irão voltar de tão presentes se encontrarem. Tu, que de dor me fazes jorrar, e mesmo depois de o sangue se esgotar, ainda água terei para dar. Sim, crucifica-me. Eu vejo a ira que vai na tua alma, filho da desgraça, porque antes de teres nascido já Ele o era, e eu mais não sou que um suspiro da Sua imensidão, incomensuravelmente pequeno e finito, mas com uma ambição, de ao lado direito Dele ficar, na expectativa de ver a justiça do Seu sofrimento te açambarcar. E mesmo assim, apesar de tudo, amo-te, amo-te como ninguém jamais te amou, mas foi precisamente isso que me trespassou. Em todo o amor que demonstras sem fim, toda a ira que em ti mora por mim, é revelada mesmo sem dizeres nada. Eu não vejo, eu sinto, e a quem sente jamais podes enganar, somente a quem se fia no olhar. A aparência é que te dá poder, é que te faz, mesmo, mover? Pois eu digo-te é por ela que tu irás sofrer. Tu sofres por o que vês, és falso. Eu sinto, pelo que sofro…
Mas há mais. A tua indiferença faz-te forte, o teu sadismo dá-te prazer, mas ainda há uma palavra a dizer, antes que se esgote este alvorecer. Pai, eu faço parte da natureza que me envolve, da imensidão que jamais conseguirei abranger, mesmo com o meu sentir infinito. E não posso pactuar com a conduta de quem dessa natureza me quer afastar, dessa crença profunda que de mim jamais alguém irá arrancar, os meus inimigos, alvos a desvendar e a destronar, porque ninguém é Rei senão Tu, eterno e perfeito, porque acredito que Tu és o Bem – eu sei-o, porque eu vi o mal – Tu és o equilíbrio, e ai reside a perfeição, Tu és a essência da vastidão. E eles, castelos na areia, reis da destruição da harmonia, marginais sós, que culpam outros seus irmãos pela sua própria condição, que se rebelam contra Ti, fonte de toda a criação, como se em Ti morasse a culpa da sua falta de orientação. Por ti, pai, eu estou aqui, mas já estava escrito nos astros, a minha passagem por este mundo, e já está escrito no mais profundo do vácuo o meu destino. E o meu destino é Ele, Ele faz parte de mim, eu sou uma ínfima parte Dele, igual a tantos outros como tu, na minha massa, mas dos maiores na descoberta Dele. Eu tentei fazer-te meu amigo, tentei mostrar-te onde erravas. Porque me fechaste a porta? Porque me revoltaste contra a natureza que me envolveu e me acolheu e me fez crescer, aprender, e me alimenta e me faz sobreviver? O teu egoísmo há-de destruir-te, pois as aparências enganam.
Inimigos, achais-vos superiores? Achais que eu é que estou errado? A erva daninha prospera nos solos, mas a beleza não é destruída por ela, a beleza transcende o óbvio. Caí por terra enquanto é tempo, vê -de o mal que fazeis, não sigais contra o que de genuíno sentis, acreditai no regresso à inocência. Podeis vencer esta guerra contra mim, mas nunca vos será perdoado a perda que provocares, o Equilíbrio que me rege será a vossa destruição e ninguém mais terá culpas disso, a não ser vós que não acreditastes. A culpa reside naqueles que lhes foi Mostrado e não acreditaram.
Saco do meu bolso, este meu dia terreno e lanço-o sobre vós. O Dia Glorioso está à vossa frente, defronte de mim somente, é uma questão tempo, se houver medição para esta passagem. A luz foge, mas ainda me resta o meu outro bolso…